domingo, 30 de abril de 2023

03 de janeiro

 3 de janeiro

1865 – Tropas paraguaias ocupam Corumbá

                                 Francico Solano Lopes, ditador paraguaio

Após a tomada do forte de Coimbra no dia 28 de dezembro, as forças paraguaias, sem resistência, entram triunfalmente em Corumbá. O episódio é acompanhado pelo historiador Other de Mendonça:

A coluna paraguaia ao mando do Coronel Vicente Barrios, cunhado do marechal Solano Lopez, a 3 de janeiro de 1865, efetua desembarque e ocupação de Corumbá, abandonada desde o dia anterior.

Do navio-chefe, fundeado junto à Mesa de Rendas, o comandante da expedição assistiu ao desfilar das tropas, divididas em duas seções, sobressaindo o fardamento novo, de um vermelho vivo, dos batalhões sexto e sétimo, este ocupando a vanguarda. Parte da expedição já havia ocupado a povoação do Ladário.

Pelas ladeiras que punham em comunicação o porto com a parte alta da vila, a força invasora serpeava em marcha acelerada, armas em prontidão, penetrando desembaraçadamente nas poucas ruas então existentes na localidade.

De quando em quando ponteando aqui e ali, raros moradores apareciam, confiantes nas suas imunidades de estrangeiros e abrigados sob as bandeiras das respectivas nacionalidades; os naturais que não puderam fugir por água internaram-se, desamparados, pelos matos vizinhos, sem guia e sem recursos".¹

Sobre o episódio, Barrios encaminha ao ministro da guerra de seu país a seguinte parte:

"Viva a Republica do Paraguay.- Sr. ministro.-
Tenho a honra de participar a V. Ex. que se acham em
nosso poder Albuquerque e Corumbá.

O pavilhão nacional tremula nesta ultima desde 3 do corrente, dia da minha chegada.

A população brasileira e guarnição destes pontos tinham-se retirado antes da nossa chegada por notícias transmitidas oportunamente pelo barão de Villa Maria, segundo declarações tomadas.  Estamos pois de posse destes pontos sem queimar um só cartucho, tendo sido a fuga do inimigo tão precipitada que deixou, como em Coimbra, toda a artilharia, armamento geral, munições e apetrechos de guerra. 

A canhoneira Anhambahy foi perseguida e tomada por abordagem no dia 6 do corrente no rio S. Lourenço pelos vapores desta divisão.

O quartel de Dourados se encontrou também abandonado.

Os vapores Ipota e Apa que fizeram o reconhecimento do Rio de S. Lourenço aprezaram o já citado vapor Anhambahy, cuja tripulação pereceu em parte, escapando-se alguns, e prisioneiros outros, comportando-se bizarramente o 1º tenente de marinha, cidadão André Herreros, a quem havia confiado esta missão e
comandava o Ipora, que deu abordagem.

Os vapores Taquari e Marquez de Olinda estão no quartel dos Dourados, onde também o inimigo abandonou um grande parque.

O povoado de Corumbá caiu em nosso poder com a maior parte de suas casas saqueadas pelos poucos habitantes que se encontraram, porém desde a chegada das nossas tropas pôs-se termo a tal desordem. 

Informado que muitas famílias fugindo deste povoado se acham metidas pelas matas, dispus que dous vapores e força de terra as recolham e devolvam ás suas casas, e neste momento me avisam que chega o Paraguai com muitas famílias, e quando as tiver desembarcado voltará ao mesmo objecto.

Enquanto dou a V. Ex. uma parte detalhada, aproveito
o regresso do 2º tenente Godoy no vapor inglês Ranger, chegado ontem, para dar a V. Ex. esta primeira noticia.

Deus guarde a V. Ex. por muitos anos. Acampamento em Corumbá, 10 de Janeiro de 1865.- Vicente
Barrios.

A S. Ex. o Sr. ministro da guerra e marinha.


Viva a Republica do Paraguay.²

A notícia da ocupação de Corumbá chegaria à imprensa brasileira um mês após:

No dia seguinte partiu Bárrios em direção à Corumbá, onde chegou no dia 3, desembarcando logo a sua gente. Aí também o valente chefe não encontrou com quem combater e ficou vitorioso: quase todos os moradores tinham-se retirado para Cuiabá.
As companhias paraguaias mandadas em exploração, começaram logo o saque da indefesa povoação. Três negociantes estrangeiros meteram-se em uma canoa e vieram pedir socorro ao chefe da expedição. 
Aí soube-se que os vapores brasileiros Anhambay e Jauru e o navio Jacobina tinham no dia 2 partido com alguma gente de Corumbá. Barrios despachou a 4 os vapores Iporã e Rio Apa no encalço dos navios brasileiros, subindo o rio São Lourenço. 
Seis léguas mais ou menos acima de Corumbá, o comandante do Iporã, André Herreros, encontrou o Jacobina abandonado e atracado e dele se apossou.
Pouco depois os dois vapores paraguaios encontraram o Anhambay. Levava este a seu bordo algumas famílias e habitantes de Corumbá. Apesar da desproporção, os brasileiros travaram a luta e o Anhambay percorreu 18 milhas, respondendo sempre o fogo do inimigo. O Iporã, sendo de maior força, tentou tomar o Anhambay por abordagem.
O comandante brasileiro, conhecendo que não poderia resistir, quis desembarcar os passageiros. Alguns destes, tendo se lançado ao rio,  foram cruelmente mortos pela fuzilaria do Iporã, à queima roupa, a exceção de sete, inclusive o maquinista Foster que ficou ao serviço dos paraguaios.
As famílias que desembarcaram foram quase todas vítimas; umas pereceram afogadas, outros atolados no terreno lodoso, onde buscaram a salvação.
Miranda e Dourados acham-se também em poder dos selvagens.
A nove milhas de Corumbá, em um ponto chamado Ladário, estacionava a esquadrilha paraguaia e na mesma altura, em terra, o exército acampado. A esquadrilha compõe-se dos vapores Igurey, Paraguari, Iporã, Rio Apa, Tacuari, Marquês de Olinda e da escuma Jacobina.
O Tacuari e Marquês de Olinda ficavam em Dorados; o Rio Apa no São Lourenço, guardando o Anhambay.
Em Corumbá achava-se uma força de mil homens, sob o comando do capitão paraguaio Gorostiaga. Sessenta e tantos estrangeiros e algumas infelizes mulheres que aqui ficaram, sofreram horrores, que a pena custa descrever.
Gorostiaga, nome de que nos devemos sempre lembrar, mandou que seus soldados saqueassem a povoação. Todas as casas foram arrombadas e tudo quanto nelas existia levado para o acampamento, onde, em presença do capitão, se repartiu a presa. Os soldados ébrios não respeitaram nem os estrangeiros, não obstante terem em suas casas as bandeiras de suas nações.
O francês Julio Amardeil e um português conhecido por Manoel Português foram vítimas dos selvagens. Amardeil estava de cama, gravemente enfermo, quando lhe saquearam a casa.
Manoel Bianchi, italiano, recusara entregar os gêneros que tinha em sua casa de negócio, ameaçaram matá-lo logo e o teriam feito, se esse infeliz não se houvesse evadido.
De casa do norte-americano Carlos Clarke roubaram toda a roupa que encontraram.
As habitações dos brasileiros foram leteralmente saqueadas e depois marcadas com um B.
No dia 10 do passado queimava-se em Corumbá toda a madeira que ali estava depositada para construção da alfândega, e matava-se o gado que era encontrado.
Os maiores excessos eram cometidos sem pudor e com revoltante brutalidade pelos paraguaios.
Os estrangeiros residentes em Corumbá tinham dirigido ao ministro italiano Barbolani uma representação pedindo-lhe auxílio. Este pedido foi levado ao Rio da Prata pelo vapor inglês Ranger.
No combate do Anhambay o Imporã perdeu o cano e sofre grandes avarias nos tambores das rodas; foi morto no combate o imediato paraguaio.
A bordo ao Iporá estendera-se uma corda na qual se enfiaram orelhas humanas cortadas aos desgraçados tripulantes do Anhambay.
Enquanto os paraguaios descansavam em Corumbá sobre seus louros manchados do sangue brasileiro, em Cuiabá parecia preparar-se alguma resistência mais séria.³

FONTE: ¹Estevão de Mendonça, Datas Matogrossenses, 2ª edição, Governo de Mato Grosso, página 19; ² Antonio Correa do Couto, Dissertação sobre o atual governo da República do Paraguai, Tipografia do Imperial Instituto Artístico, Rio de Janeiro, 1865, página 44..³Correio Mercantil (RJ), 04/02/1865.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

 teste